NELSON RODRIGUES
Morto há 30 anos, o autor de 'Vestido de Noiva' e 'Bonitinha, mas Ordinária' tem suas peças freqüentemente remontadas
Há 30 anos, o Brasil perdia não apenas um de seus maiores dramaturgos, mas um de seus mais originais e polêmicos pensadores. Um dos responsáveis pela modernização do teatro brasileiro, Nelson Rodrigues ganhou uma projeção muito maior do que suas 17 peças, graças à extensa produção como escritor e cronista, e à própria exposição pública. Mesmo quem nunca assistiu a clássicos do teatro brasileiro como “Vestido de Noiva”, “Álbum de Família”, “A Falecida”, “Os Sete Gatinhos” ou “Bonitinha, mas Ordinária” era capaz de identificar seu autor por expressões como “óbvio ululante”, “complexo de vira-latas” e “toda unanimidade é burra”, repetidas a exaustão em seus textos, entrevistas a outros jornalistas e programas de TV como “A Cabra Vadia” e “Grande Resenha Facit”.
Morto em 21 de dezembro de 1980, vítima de insuficiência vascular cerebral, após sete paradas cardíacas, Nelson Rodrigues teve uma vida tão espetacular e dramática quanto os personagens que criava para o teatro ou para folhetins como “Meu destino é pecar” e “Asfalto selvagem”. Vencendo uma infância humilde e a tuberculose que traria sequelas permanentes à sua saúde, o autor também levaria para sua obra várias tragédias familiares e seus casos amorosos.
O dramaturgo nasceu da cidade do Recife no dia 23 de agosto de 1912, sendo o quinto dos 14 filhos de Maria Esther Falcão e o jornalista Mário Rodrigues. Seu pai era deputado e jornalista do “Jornal do Recife”, e mudou-se para o Rio de Janeiro por problemas políticos. Nelson iniciou sua carreia como jornalista, em 1925, especializando-se na página policial.
Sua primeira peça “A Mulher sem Pecado”, já mostra a neurose das relações. O texto fala sobre o ciúme e teve encenação realizada pela companhia Comédia Brasileira, em 1942. Com “Vestido de Noiva”, em 1943, com encenação de Ziembinski ao lado do grupo Os Comediantes, o teatro brasileiro chega a um novo patamar. A ação tem três planos – a memória, o coma e o real – mostrando todos os aspectos da vida da personagem. “Álbum de Família”, de 1945, mostra o lado primitivo dos personagens, trabalhando o ser humano a partir da célula da família. Temas como incesto entre irmãos, mãe e filho, pai e filha. Com isso Nelson reconhece sua criação como "teatro desagradável" e sua obra sofre rejeição e censura. “Álbum de Família” só foi encenada 22 anos depois de ter sido feita.
Em 1946 ele escreve “Anjo Negro”, com a qual sofreu censura religiosa, mas que conseguiu montar dois anos depois, com Ziembinski, pelo Teatro Popular de Arte, tendo no elenco Maria Della Costa e Sandro Polloni. Ziembinski também montou com Nelson “Dorotéia”, em 1950, tendo pouca aceitação do público. Em 1951, o monólogo “Valsa Nº 6” é interpretado por Dulce Rodrigues, irmã do autor, e dirigida por Henriette Morineau. Em 1953, Nelson monta a primeira tragédia carioca, “A Falecida”, encenada por José Maria Monteiro, com a Companhia Dramática Nacional, a CDN, tendo Sônia Oiticica e Sergio Cardoso como protagonistas. Em 1947, vem a encenação de “Senhora dos Afogados”, que teve uma tentativa de montagem no Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), mas foi interrompida e só retomada em 1954 pela CDN, com direção de Bibi Ferreira. Nelson subiu ao palco e foi vaiado pelo público, porque mais uma vez mostrou o incesto entre filha e pai, além de assassinatos na família.
“Perdoa-me por me Traíres”, a história de uma órfã adolescente que vive sob a repressão de um casal de tios, novamente causa reação negativa, em 1957. Produzida pelo ator e autor Gláucio Gill, Nelson faz parte do elenco junto com Abdias do Nascimento, líder do Teatro Experimental do Negro (TEN). No mesmo ano, Nelson escreve “Viúva, Porém Honesta”, criticando jornalistas e a crítica especializada. Em 1958, “Vestido de Noiva” recebe uma nova montagem, da Companhia Nydia Licia-Sergio Cardoso em uma versão bem diferente da primeira, conseguindo então uma boa recepção da mídia. “Os Sete Gatinhos” é uma comédia que retoma o tema da família, que se desestrutura por causa de uma das filhas. A peça tem Willy Keller na encenação, e é produzida pelo irmão de Nelson, Milton Rodrigues.
Em 1961, “Boca de Ouro” é encenada no Teatro Nacional de Comédia (TNC), por José Renato, fundador do Teatro de Arena. O bicheiro cafajeste da Zona Norte foi interpretado por Milton Moraes. Fernanda Montenegro encomenda uma peça de Nelson e ele escreve “O Beijo no Asfalto” em 21 dias, texto que aborda o lado sórdido da imprensa e da polícia. O espetáculo foi montado em 1961, no Teatro dos Sete, com direção de Fernando Torres, cenografia de Gianni Ratto, com Sergio Britto, Oswaldo Loureiro e Ítalo Rossi ao lado de Fernanda no elenco.
Em 1962, Martim Gonçalves monta “Otto Lara Resende ou Bonitinha, mas Ordinária”, com Tereza Raquel interpretando a mãe louca em mais uma trama polêmica de Nelson. Em 1965, Ziembinski em mais uma pareceria com o autor, monta “Toda Nudez Será Castigada”, a história de um homem conservador que se apaixona por uma prostituta, Geni, interpretada por Cleyde Yáconis. Em 1967, “Álbum de Família” consegue ser montada, depois de 20 anos, pelo Teatro Jovem, de Kleber Santos, com Vanda Lacerda, José Wilker e Thelma Reston no elenco. A próxima peça demora oito anos para sair. Nelson passou um tempo sem escrever tanto por problemas de saúde como profissionais, mas também porque estava cansado da reação pública aos seus textos. Em 1973, é montada “Anti-Nelson Rodrigues”, com a direção de Paulo César Pereio e que traz pela primeira vez um final feliz aos protagonistas.
A última peça, “A Serpente”, é escrita em 1978. O texto mostra duas irmãs que se casam no mesmo dia, uma é feliz no casamento e a outra não consegue sequer perder a virgindade em sua lua-de-mel. O espetáculo estreia em 1980, dirigida por Marcos Flaksman, no Teatro do BNH, no Rio de Janeiro. Esse teatro passa a se chamar Teatro Nelson Rodrigues, após a morte do autor.
Até hoje os espetáculos de Nelson Rodrigues ganham dezenas de remontagens. Além de suas peças, seus romances, contos e crônicas também ganham versões teatrais. Vinte de suas histórias foram adaptadas para o cinema. Nelson Rodrigues morreu na manhã do dia 21 de dezembro de 1980. Neste mesmo dia, ele faria 13 pontos na Loteria Esportiva, num bolão que tinha feito com seu irmão e alguns amigos do jornal “O Globo”
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário